“A voz de Milton Nascimento em presença”. Este foi o título da tese defendida pela professora Thais dos Guimarães Alvim Nunes, do Departamento de Artes e Comunicação (DAC) da UFSCar, desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Música do Instituto de Artes (IA) da Unicamp. O trabalho foi realizado sob orientação do professor Antônio Rafael Carvalho dos Santos, do IA.

O objetivo principal da pesquisa foi entender de que maneira a expressão vocal do cantor brasileiro Milton Nascimento se materializa em performances midiatizadas, especificamente em gravações de discos. “Busquei, em meus estudos, entender como a voz se faz presente tanto do ponto de vista das qualidades materiais – como tom, timbre, alcance, altura e registro – quanto simbólicas, além dos sentidos que ela pode transmitir”, informa Thais. Para isto, a pesquisadora ouviu e analisou 38 discos lançados pelo artista ao longo dos seus 50 anos de carreira.

De acordo com a docente, o artista possui uma voz privilegiada, porém a grandeza de sua obra vocal está na maneira com que o artista a manipula através da experimentação, da criação e do diálogo que estabelece com outros músicos, outras vozes e outros instrumentos. “Ao observar detalhes em sua voz a partir da escuta, pude perceber sua movência – termo utilizado pelo pensador Paul Zumthor – ao longo dos 50 anos de trajetória artística, inerente das manifestações artísticas que encontram eco na oralidade”, explica.

Ao longo dos anos, Thais apoiou suas reflexões de pesquisa sobre escuta com o autor francês Roland Barthes (1915-1980). Outras influências da pesquisadora foram a análise de música popular traçada por Philip Tagg; a semiótica da canção de Luiz Tatit; e na transposição da semiótica da canção para a análise do componente vocal, e portanto, na análise do gesto vocal, realizada por Regina Machado. Os conceitos de presença, movência e nomadismo foram amparados nas reflexões de Paul Zumthor (1915-1995).

“Com todo o embasamento teórico e prático, pude perceber que as escolhas estéticas de Milton Nascimento são conscientes, que ele conhece e explora sua voz a serviço das canções e das músicas instrumentais que interpreta”, afirma a pesquisadora. Thais explica que a pesquisa também possibilitou a identificação do processo de criação contínua do artista, ou seja, a movência ao longo da carreira lhe possibilita reinterpretar canções e ao mesmo tempo transformá-las em algo novo. “A maior surpresa que tive foi poder constatar os sentidos trazidos pela respiração no canto. Muitas vezes damos maior atenção a notas, timbres, construções melódicas, registro, dinâmica, mas Milton mostrou que a respiração entre as frases musicais, ou mesmo a segmentação de tais frases, agregam sentido ao texto cantado, bem como indicam o gesto corporal do cantor – mesmo quando a recepção ocorre através de uma gravação desprovida de imagem”, ressalta.

A autora da tese conta que o desenvolvimento de sua pesquisa ajudou a trazer reflexões para as matérias ministradas no DAC na UFSCar, já que é responsável pelas disciplinas de Voz e Expressão e Linguagem e Estruturação Musical no curso de Música. “Trago, em ambas, conteúdo e repertório da música popular e em nosso curso de Educação Musical a distância também ministro as disciplinas de canto popular”, ressalta. Thais possui formação superior centrada na música popular e suas principais áreas de atuação – tanto no ensino quanto na pesquisa – são justamente o canto, a canção popular e a música popular brasileira. Com a defesa de sua tese, a pesquisadora pode incorporar conhecimentos à sala de aula e manter ainda mais o seu interesse pelo canto popular.