Pesquisa realizada na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) analisa a utilização de métodos de microscopia in situ para visualização de processos biológicos. Os estudos, coordenados pelo professor Valdinei Luís Belini, do Departamento de Engenharia Elétrica (DEE) da Universidade, abordam a utilização de um instrumento óptico de alta resolução para visualização in situ de bioprocessos como, por exemplo, a fermentação industrial de cana-de-açúcar para produção do etanol.
O professor Belini explica que os microscópios in situ são diretamente acoplados às suspensões de células e partículas. Essencialmente, o equipamento consiste de um microscópio óptico de transmissão em campo claro composto por fonte de iluminação, lente objetiva e uma câmera digital de alta resolução. Lampejos de luz são gerados por um diodo emissor de luz dedicado e guiados através de uma fibra óptica posicionada opostamente a uma janela de quartzo que separa a lente objetiva da suspensão sob investigação.
"O conceito da microscopia in situ foi primeiramente descrito em 1991 pelo professor Hajo Suhr da Hochschule Mannheim, na Alemanha. Uma sofisticada unidade eletrônica microprocessada controla parâmetros elétricos do sistema de iluminação e de aquisição de imagens, as quais são exibidas em tempo real na tela de um computador pessoal de uso geral a uma taxa de até 15 imagens por segundo. Com uma resolução óptica de aproximadamente 0,5 micrometros é possível visualizar a forma de bactérias Escherichia coli, a estrutura morfológica de células de levedura Saccharomyces cerevisiae e a morfologia de células animais", afirma o docente. Nos anos de 2012 e 2013, o professor Belini realizou seu pós-doutoramento na Hochschule Mannheim, sob supervisão direta do Prof. Suhr, e estudou a técnica da microscopia in situ aplicada ao monitoramento de bioprocessos.
A utilização do microscópio in situ apresenta vantagens que otimizam o controle e o estudo dos processos biológicos, como o monitoramento online e em tempo real da morfologia de populações microbianas. Com base em informações visuais, comportamentos anormais das diferentes populações microbianas podem ser rapidamente observados, permitindo, por exemplo, que operadores do processo implementem ações corretivas com maior exatidão.
"O uso dessa técnica no contexto da produção industrial de etanol representa uma quebra de paradigma por simultaneamente eliminar a coleta e o preparo de amostras e produzir um fluxo contínuo de dados visuais baseados em imagens microscópicas capturadas diretamente do interior do ambiente natural da fermentação. Pela eliminação da coleta de amostras e da variabilidade de análises laboratoriais, estimativas mais consistentes e estatisticamente mais significativas de parâmetros morfológicos relevantes das suspensões são determinadas. Além disso, a obtenção de informações visuais sub-micrométricas oferece condições pertinentes para auxiliar no estudo de interações específicas entre as diferentes populações microbianas que coabitam dornas de fermentação, com foco no incremento da eficiência do processo", salienta Belini.
O professor afirma, ainda, que o uso da técnica da microscopia in situ pode ampliar os estudos de bioprocessos e culturas biológicas. "Diferente de outras técnicas para estimativas online de parâmetros biológicos os dados produzidos em uma nova dimensão de medições têm potencial para produzir resultados originais e proporcionar um recurso tecnológico importante para auxiliar o controle de bioprocessos envolvendo substratos complexos. Micrografias in situ de suspensões capturadas diretamente do interior do meio natural de fermentação constituem uma rica fonte de informações desde que elas mostram a completa estrutura visual das suspensões, incluindo - se presente – contaminações microbianas, uma diversidade de morfologia de células e de aglomerações de células, além da morfologia da levedura selecionada para a fermentação. Nesse contexto, estima-se contribuir para uma perspectiva promissora para o avanço do conhecimento científico e tecnológico e inovação do País na área de automação de análises microbiológicas no âmbito das energias limpas e renováveis, uma das principais componentes da matriz energética do País", acredita o pesquisador.
Na UFSCar, o professor Belini, do grupo de pesquisa Visão Computacional, conduz estudo pioneiro por aplicar a microscopia in situ em substratos complexos para o monitoramento microscópico em tempo real de bioprocessos. As pesquisas são realizadas em parceria com os departamentos de Engenharia Química e de Computação, ambos do Campus São Carlos, e do Departamento de Tecnologia AgroIndustrial e SocioEconomia Rural do Campus Araras, além da Hochschule Mannheim, na Alemanha.
Os estudos na UFSCar atuam na caracterização morfológica de linhagens industriais de leveduras fermentativas e contaminantes, monitoramento de interações entre os microrganismos e outras temáticas relacionadas aos processos fermentativos. "No caso específico da fermentação da cana-de-açúcar, o principal desafio para caracterizar suspensões de leveduras por uma técnica baseada em análise de imagem aplicada a um substrato naturalmente escuro e viscoso, como é o caso do melaço, decorre da presença de uma variedade importante de micro-objetos: fragmentos de células de leveduras, populações endógenas contaminantes (bactérias e leveduras selvagens), uma moderada quantidade de resíduo sólido (tipicamente bagaço), pequenos cristais de açúcar, além de uma quantidade variável de concentração e tamanho de partículas não celulares, tais como aglomerações de componentes do substrato", observa Belini.
No mês de julho, o professor Belini realizou uma visita à Hochschule Mannheim, na Alemanha, e participou de atividades relacionadas à caracterização de um novo sistema óptico, sem a utilização de ajustes mecânicos, para a visualização in situ de partículas biológicas em suspensão, como culturas de células humanas e animais.
